Mostrando postagens com marcador Maria Santíssima. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Maria Santíssima. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

É errado usar o Terço ou Rosário no pescoço?




Salve Maria Imaculada!

É comum ouvirmos a pergunta: se é errado ou não usar o Terço ou o Rosário no pescoço.? Muita gente com um aparente zelo pelo Rosário, pela devoção e por seu bom uso, tem condenado veementemente o uso deste santo objeto devocional no pescoço. Dizem eles que o Rosário foi feito para se rezar e não para se usar como bijuteria.

Por um lado até está certo falar isso, pois do que adianta carregar no pescoço as “bolinhas”, mas se depois elas não estão em nossas mãos, e as Ave-Marias em nossos lábios?

Só que eu não conheço o coração de ninguém, ou seja, somente Deus que é onisciente, onipresente e onipotente é que vai saber se em determinada hora do dia aquela pessoa que traz o Rosário no pescoço reza ou não.

Confira a Resposta:


Para analisarmos se é errado ou não, devemos ir por um caminho que só a pessoa que usa poderá responder: qual a intenção do coração? Se o uso do Rosário no pescoço for para honrar à Santíssima Virgem Maria, para mostrar que devemos recorrer ao Rosário, aí não é pecado. 

Agora se o uso for apenas por moda, vaidade, reduzindo o Santo Rosário a um simples acessório para colocar no pescoço por pura vaidade, aí já é errado e até pecado. 

Isso vale também para quem coloca o Terço no retrovisor do carro. É errado? não digo que seja, mas será que quem coloca o Terço no retrovisor está procurando honrar à Santíssima Virgem, ou está querendo usar o Terço como amuleto para dar sorte, evitar acidente, etc.? 

Tanto é que tem gente que tem o Terço pendurado, e junto um pé de coelho... Ora, o sagrado com o profano! Uma santa devoção com algo pagão. Entende?

O problema não é propriamente o uso do Terço no pescoço, mas a intenção, como já vimos. 

Eu desconheço algo oficial da Igreja a respeito disso, mas tomo por base o livro “O Segredo do Rosário” escrito por São Luís Maria Grignion de Montofort. São Luís, por vezes citando outros santos, como o Beato Alano, fala até mesmo da importância de se usar o Rosário ao pescoço. 

Vai dizer o santo: “O Bem-aventurado Alano disse que um homem que ele conhecia, tinha tentado todos os tipos de devoções a fim de se ver liberto de um espírito maligno que o possuía, mas sem sucesso. Finalmente, ele pensou em usar o Rosário em volta de seu pescoço, o que veio a aliviá-lo consideravelmente. 

Ele descobriu que sempre que se despia do Rosário, o demônio o atormentava cruelmente, então ele resolveu usá-lo dia e noite. Isto fez com o espírito maligno se afastasse para sempre, porque ele não podia suportar tão terrível corrente. 

O Bem-Aventurado Alano também testemunhou que ele tinha liberto grande número de pessoas que estavam possessas simplesmente colocando o Rosário em volta de seus pescoços.” 

Então aqui já vimos que usar o Rosário no pescoço, com devoção, e não com superstição ou como bijuteria, ajuda nas tentações e é uma grande arma contra satanás, ainda mais se não apenas usar o Rosário, mas rezar o Rosário. 

Usar o Rosário no pescoço é um escudo contra os dardos inflamados do inferno.

Vou citar aqui mais um caso citado por São Luís no “O Segredo do Rosário”, mas no caso a pessoa não usava o Rosário no pescoço, mas na cintura: “Nossa Senhora abençoa não somente aqueles que propagam seu Rosário, mas ela recompensa copiosamente a aqueles que com seu exemplo atrai os demais a esta devoção. 

Alfonso, Rei de León e da Galícia,desejando que todos os seus servos honrassem a Santíssima Virgem rezando o Rosário, colocava um grande Rosário em seu cinto e sempre o usava, mas infelizmente nunca o rezava. 

Contudo, o fato de usá-lo, motivava a toda a corte a rezá-lo devotamente. Um dia o rei adoeceu gravemente e quando creram que estava para morrer, ele caiu em êxtase, viu-se a si mesmo perante o trono do julgamento de Nosso SENHOR. 

Muitos diabos estavam lá a acusá-lo de todos os pecados que havia cometido e Nosso SENHOR como Juiz Soberano já estava para condená-lo ao Inferno, quando Nossa Senhora apareceu a interceder por ele. 

Ele pediu uma balança e colocou seus pecados num dos pratos. No outro prato Nossa Senhora colocou o Rosário que ele sempre carregava na cintura, juntamente com todos os Rosários que foram rezados por causa de seu exemplo. Viu-se que os Rosários pesaram mais do que seus pecados. 

Ao olhá-lo com grande benignidade, Nossa Senhora disse: ‘Como recompensa por esta pequena honra que você me fez em usar meu rosário, eu obtive uma grande graça de meu FILHO. Sua vida será prolongada por mais alguns anos. 

Viva-os sabiamente, e faça penitência’. Quando o Rei recobrou sua consciência, exclamou: ‘Bendito seja o Rosário da Santíssima Virgem Maria, pelo qual fui liberto da condenação eterna!’. 

Após recuperar a saúde, ele passou o resto de sua vida a propagar a devoção do Santo Rosário e o rezou fielmente todos os dias.” 

Eis o que tenho tentado dizer: se a intenção de usar o Rosário no pescoço, no braço, na cintura, até no retrovisor do carro, for para fazer a Virgem Maria honrada, amada e conhecida, não tem problema.

Vimos neste caso que apesar do rei não rezá-lo, só por usar na cintura, deu um bom exemplo, fazendo com que o povo rezasse o Rosário. Isso foi agradável à Nossa Senhora.

No entanto, não achemos que basta usar o Rosário no pescoço, ou mesmo medalhas milagrosa de Nossa Senhora das Graças, escapulários, etc., sem mudar de vida, achando que vamos entrar no Céu porque acabamos de ver como nossa Mãe é Misericórdia. 

Não abusemos da Misericórdia de Deus e de Nossa Senhora. Nós não somos mais ignorantes. Se persistirmos no pecado, mesmo com consciência, e usarmos das devoções como desculpa para o pecado, estaremos cometendo um pecado de presunção, um pecado contra o Espírito Santo. 

Por que falo isso? Falo isso justamente porque nesse exemplo que São Luis Maria de Montfort nos deu, mostra-nos que a graça que Nossa Senhora deu para o rei foi de ser prolongada a sua vida aqui na terra, para que ele fizesse penitência, e não somente usasse o Rosário na cintura, mas que rezasse também. 

E vai dizer São Luís que ele rezou o Rosário TODOS OS DIAS. Talvez Nossa Senhora já tenha livrado da morte muitos de nós, porque trazemos junto ao nosso corpo um Terço ou Rosário, uma medalha, ou um escapulário; talvez Ela tenha prolangado nossos dias, e esteja esperando que emendemos de vida, que passemos a rezar o Terço diário ou mesmo o Rosário diário. 

Tiago vai dizer “sede cumpridores da palavra e não apenas ouvintes; isto equivaleria a vos enganardes a vós mesmos.” (Tiago 1,22) – Ou seja, fazendo uma analogia, podemos também dizer: Sejam devotos do Rosário rezando, e não apenas portando-o; isso equivaleria a vos enganardes a vós mesmos. 

Em que sentido este enganardes a vós mesmos? No sentido de que se eu acho que basta usá-lo no pescoço sem rezar e fazendo todo tipo de mal, eu estou abusando da devoção. Pois muitos caem em pecado por fraqueza, por ignorância, por não saberem a verdade; agora se nós sabemos a verdade, sabemos que temos que mudar de vida, não podemos ficar portando o Rosário sem rezá-lo. Seria muita ingratidão para Aquela que já tantas vezes nos livrou da morte repentina e de termos ido para o inferno.

O problema também está no mundo de hoje. Hoje querem tirar tudo quanto é de exterior. Não devemos retirar o uso exterior do Rosário por causa dos escrúpulos ou mesmo de alguns abusos de outras pessoas. 

Querem tirar as imagens de repartições públicas, aliás tiraram até mesmo dos templos, não se tem mais muitas imagens e pequenos altares em casa... Cadê as casas com quadros do Sagrado Coração de Jesus e do Imaculado Coração de Maria? Como diz o próprio São Luís, falando sobre a importância dos escravos de Nossa Senhora usar as correntes como sinal, afirma algo no sentido de que muitas vezes só caímos em pecado após o batismo porque não temos nenhum sinal. 

Ora, se quem tá usando o Terço ou Rosário no pescoço vive em pecado mortal, imagine se ele perdesse toda devoção e arrancasse logo de uma vez... Estaria perdido, pois como em algum momento ele se lembraria de Deus e deixaria o arrependimento entrar em seu coração e procurar um padre para se confessar? 

Muito cuidado com as condenações, pois nós não conhecemos o coração. Vai nos dizer São Pio X:quando não está inteiramente apagada a chama da fé, ainda resta a esperança de que se elimine a corrupção dos costumes; mas, quando à depravação se junta a ignorância da fé, já não resta lugar a remédio, e permanece aberto o caminho da ruína”.

A devoção à Santíssima Virgem, em muitos casos, é esta última fagulha da fé. 


E se apagarmos ela, dizendo para os pobres ignorantes que não se deve usar o Rosário no pescoço sem rezá-lo, ele se esquecerá de Deus e de Nossa Senhora por completo, e então estará tudo perdido. 

Uma vez um rapaz me abordou, e falava que rezava o terço, conversa vai, conversa vem, dei-lhe o meu terço. Ele tentou colocar no pescoço mas não coube. Mas o fato é que ele disse que rezava todos os dias o terço. 

Enfim, eu segui para o terminal de ônibus para ir par ao Grupo de Oração, e ele entrou em um bar. Ora, se ele está indo para o bar mesmo rezando o terço, imagine se ele não rezasse e não portasse o terço? Vocês acham que se não fosse Nossa Senhora eu estaria indo para o Grupo de Oração? 

Talvez eu fosse mais um companheiro de copo dele, ou mais um jogado nas noitadas. Olho para trás e louvo a misericórdia de Deus. E agradeço mais porque essa Misericórdia chegou por Maria Santíssima. 

Agora se, se apaga por completo essa chama da fé... Eu tenho visto pessoas que no coração tem uma devoção à Nossa Senhora, mas que no entanto não sabem rezar o terço. 

Gente, abram os olhos: nós vivemos em mundo completamente “descritianizado” em muitos lugares. A pessoa foi ensinada a tudo, menos a rezar. E então, nós devemos aproveitar e evangelizar essas pessoas, e ensiná-las a rezar. 

Devemos ir rezar nas suas casas, fazer panfletos ensinando a rezar. Se nós deixarmos a pequena chama que ainda se tem de devoção à Nossa Senhora se apagar, a coisa só tende a piorar.

O Papa Francisco que é muito devoto de Nossa Senhora, e nos mostrou seu terno amor pela Mãe de Deus durante a JMJRio2013, disse que não queria uma Igreja “tranqüila”, mas queria uma Igreja missionária. 

Eis a nossa missão: vamos propagar o Rosário pelo Brasil e pelo mundo. Vamos distribuir Terços, Rosários, ensinar a rezar, distribuir medalhas milagrosas de Nossa Senhora das Graças, escapulários... 

Enfim, vamos sair do comodismo de ficar criticando quem usa o Rosário, e vamos rezar o Rosário para que quem usa tais objetos devocionais possa se converter. Vamos evangelizar. 

Vamos sair desse comodismo maldito que vem da mais profundezas do inferno. Clamemos por um novo vigor, que o Espírito nos ilumine, que nos dê essa graça, de no ventre da Virgem Maria, sejamos gerados novos homens e mulheres propagadores do Rosário. Sim, queremos participar deste novo Cenáculo.

E só para concluir sobre a questão do usar ou não o Rosário no pescoço, São Luís vai citar que quem usa o Rosário no pescoço, por exemplo, ganha indulgências plenárias (isso nas regras da época). Dizia ele: “Aqueles que usam o Rosário no corpo (pescoço ou cintura) em público por devoção e como bom exemplo poderão ganhar cem dias de indulgência”. 

Então, meus queridos, não tenhamos medo de sermos chamados de fanáticos, de loucos, de bitolados, se é por amor à Nossa Mãe não tem problema. Honremos Nossa Senhora. Levemos o mundo todo a amar e a honrar à Virgem Maria.

“Os hereges, todos os que são filhos do mal e claramente possuem selo de reprovação de DEUS, têm horror á Ave Maria. Eles ainda rezam o PAI Nosso, mas nunca a Ave Maria; eles prefeririam colocar uma cobra venenosa em volta de seus pescoços que um Escapulário ou carregar um Rosário.”
(São Luís Maria Grignion de Montfort)

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

O significado das dores de Nossa Senhora.

As dores de Nossa Senhora têm seu sentido mais profundo no mistério pascal de Jesus Cristo.
Para entender o sofrimento e as dores de Nossa Senhora e a dureza com a qual ela é tratada por seu Filho Jesus Cristo nas narrativas bíblicas, é necessário compreender o sentido da constante iniciação à fé pura e o estar de pé junto à cruz. Maria esteve com Jesus, junto à cruz1, “não sem desígnio de Deus, sofrendo com o seu Filho único, e associando-se com coração de mãe ao Seu sacrifício, consentindo com amor no sacrifício da vítima por ela mesma gerada. Finalmente, pelo próprio Cristo Jesus moribundo na cruz foi dada como mãe ao discípulo com estas palavras: ‘mulher, eis aí o teu filho’”2, e depois ao lado daquele a quem Ele amava: “Eis a tua mãe!”3Todo o sofrimento da Mãe do Senhor, especialmente as dores pela crucifixão e morte do seu Filho, tem seu sentido mais pleno no mistério pascal, na obra da salvação do mundo.

Ficamos surpresos, sem saber a razão das palavras e do tratamento de Jesus para com a sua Mãe, tanto em Caná como no Calvário4, nos quais ela é tratada por “mulher”. Seu próprio Filho Jesus Cristo é “o primeiro a empunhar a espada que a deve trespassar”5. Maria estava sendo preparada, desde a profecia de Simeão6, passando pela forma dura com a qual Jesus a tratou em Caná7 e em outras narrativas bíblicas, para o momento decisivo aos pés da cruz. A providência divina usou dessa dura pedagogia com a Virgem Maria para o seu amadurecimento na fé, para que ela estivesse de pé junto à cruz de Cristo8.
No Calvário, manifestam-se o aparente fracasso do Filho e o seu abandono pelo Pai, aos quais a Mãe precisa dizer “sim”, pois ela havia aceitado todo o destino de seu Filho9. “E como para encher totalmente o cálice amargo, o Filho, ao morrer, abandona explicitamente sua mãe, na medida em que se lhe retira e lhe atribui um outro filho: ‘Mulher, eis o teu filho’”10. Nesta passagem bíblica, vemos o cuidado de Jesus com a sobrevivência de sua Mãe, e se “torna evidente que Maria manifestamente não tinha outros filhos segundo a carne, pois, senão, a sua entrega ao discípulo amado seria supérflua e inadmissível”11.
Entretanto, há um outro motivo para essa passagem, que não deve passar despercebido: “Tal como o Filho é abandonado pelo Pai, também ele abandona sua mãe, de forma que ambos estão unidos no mesmo abandono. Só assim ela está intimamente preparada para assumir a maternidade eclesial relativamente a todos os novos irmãos e irmãs de Jesus”12.
A obediência da Mãe do Salvador, a sua abertura à vontade do Pai, a fez livre para assumir esta maternidade espiritual sobre os crentes. O engrandecer Deus13, que está presente em Maria, significa tornar-nos livres para Ele, significa um verdadeiro êxodo, uma saída do ser humano de si mesmo, a passagem da oposição para a união das duas vontades, a vontade humana e a divina, que passa pela cruz da obediência. Este aspecto crucificante da graça, da profecia e da mística, encontramos referido em Lucas, no que diz respeito a Maria, em primeiro lugar no encontro com o velho Simeão. Ele diz profeticamente a respeito da Mãe de Jesus: “Uma espada traspassará a tua alma!”14. Esta profecia de Simeão nos remete à profecia de Natã a Davi, que havia mandado matar Urias: “A espada jamais se afastará de tua casa”15. “A espada que impende sobre a casa de Davi fere agora o coração de Maria. No verdadeiro Davi, que é Cristo, e em sua mãe, a Virgem pura, a maldição é executada e superada”16. A espada que transpassará o coração de Maria está ligada à paixão do Filho, que se tornará a sua própria paixão.
A paixão da Virgem Maria começa na sua visita ao Templo17. Nossa Senhora deve aceitar a primazia do verdadeiro Pai e do Templo, renunciando Àquele a quem deu à luz. Ela leva às últimas consequências o “sim” à vontade de Deus à medida que se retrai e liberta o Filho para sua missão. Nos momentos em que é repelida por Jesus, durante a sua vida pública, neste retraimento de Maria dá-se um passo importante, que se cumprirá na cruz com a palavra: “Mulher, eis o teu filho”18. Já não é Jesus, mas sim o discípulo amado que é seu filho. “A aceitação e a disponibilidade é o primeiro passo que lhe é pedido; o abandono e a renúncia é o segundo. Só assim a sua maternidade se torna perfeita”19: a bem-aventurança segundo a qual é dito “Feliz o ventre que te trouxe e os seios que te amamentaram”20 só se realiza, verdadeiramente, quando se torna outra bem-aventurança: “Felizes, sobretudo, são os que ouvem a Palavra de Deus e a põem em prática”21. Dessa forma, “Maria é preparada para o mistério da cruz, que não termina simplesmente no Gólgota. O seu Filho permanece sinal de contradição e ela é mantida até o fim na dor da contradição, no sofrimento da maternidade messiânica”22.
Na imagem de Nossa Senhora das Dores, da Mãe sofredora, que tem o Crucificado nos seus braços, “nesta mãe compadecida os sofredores de todos os tempos viram a imagem mais pura da compaixão divina, que é a única verdadeira consolação. Pois toda a dor, todo o sofrimento é, na sua essência última, solidão, perda de amor, felicidade destruída pelo inaceitável. Só o ‘com’ da com-paixão pode curar a dor. […] Deus não pode padecer, mas pode compadecer-se”23. Há uma paixão muito íntima em Deus, que é a sua própria natureza: o amor. Por ser Amor, não é estranho a Deus o sofrimento sob a forma de compaixão. Nesse sentido, “a Cruz de Cristo é a compaixão de Deus pelo mundo”24.
No Antigo Testamento, a compaixão de Deus se expressa em hebraico pela palavra rahamim, que significa “seio materno”. Esta palavra hebraica exprime o estar “com” o outro, a aptidão humana de estar presente com o outro, recebê-lo, sustentá-lo, dar-lhe vida enquanto ser assumido. “Com uma palavra da linguagem do corpo, o Antigo Testamento diz-nos como Deus nos acolhe e nos sustenta com um amor de compaixão. […]. A imagem da Pietá, a mãe que chora o filho morto, tornou-se, na tradução viva desta palavra: nela se torna manifesto o sofrimento maternal de Deus”25.
Assim, na imagem da Mãe lacrimosa, imagem da rahamim de Deus, a imagem da cruz se cumpre inteiramente, porque a cruz é assumida, a cruz é compartilhada no amor que nos permite, na sua compaixão maternal, experimentar a compaixão de Deus. “A dor da mãe é dor pascal que já opera a abertura da transformação da morte à presença salvífica do amor”26. A alegria da anunciação está presente no mistério da cruz, pois a verdadeira alegria nos permite ousar o êxodo do amor até o íntimo da santidade ardente de Deus. Esta alegria verdadeira não é destruída pelo sofrimento, mas é levada por este à sua plena maturidade. Tal maturação possibilita uma nova maternidade. Esta “’nova maternidade de Maria’ […] gerada pela fé, é fruto do ‘novo’ amor, que nela amadureceu definitivamente aos pés da cruz, mediante a sua participação no amor redentor do Filho”27.
Nossa Senhora das Dores, rogai por nós!

sábado, 13 de setembro de 2014

A Maternidade Divina de Maria

O primeiro dos quatro dogmas marianos é o da maternidade divina de Maria. Primeiro, historicamente. Primeiro, como razão de todos os outros. O dogma que declara verdade de fé que Maria é Mãe de Deus foi proclamado pelo Concílio de Éfeso, no ano 431. Maria recebeu o nome de "Theotokos", palavra grega que diz exatamente "Mãe de Deus", e foi julgado insuficiente o título de "Christotokos", ou seja "Mãe de Cristo". 

A controvérsia era chefiada, de um lado, pelo Patriarca de Constantinopla, Nestório, bispo famoso como orador sacro, como líder e organizador, como conhecedor das Escrituras; por outro lado, o Patriarca de Alexandria, Cirilo, também exímio pregador, teólogo refinado, excelente bispo. Ambos tinham seguidores bispos, padres, leigos. Nestório ensinava que Maria era só mãe do Cristo-homem, porque lhe parecia absurdo uma criatura ser mãe do criador. Cirilo contestava com veemência, afirmando que não podia haver dois Cristos, um homem e outro Deus. E havendo um Cristo só, embora com duas naturezas inseparáveis, Maria era mãe do Cristo-homem e mãe do Cristo-Deus, portanto sua maternidade era tão divina quanto humana, ela era verdadeiramente "Theotokos", Mãe de Deus. O Concílio deu razão a Cirilo e declarou herética a posição de Nestório que, humildemente, se retirou da vida pública e voltou à vida que levava antes de ser bispo e patriarca, a vida de monge. 

Na carta encíclica "Fulgens Corona", com que o Papa Pio XII comemorou os cem anos do dogma da Imaculada Conceição, vem lembrado que a maternidade divina de Maria constitui a mais alta missão, depois da que recebeu o Cristo, na face da terra, e que esta missão exige a graça divina em toda a sua plenitude. Continua o Papa: "Na verdade, desta sublime missão de Mãe de Deus nascem, como duma misteriosa e limpidíssima fonte, todos os privilégios e graças, que adornam, duma forma admirável e numa abundância extraordinária, a sua alma e a sua vida. Por isso, com razão declara Santo Tomás de Aquino que a Bem-Aventurada Virgem Maria, pelo fato de ser Mãe de Deus, recebe do bem infinito, que é Deus, uma certa dignidade infinita" (n.10). 

Depois de Cristo, a maior e mais excelsa missão na terra; por causa de Cristo, revestida de uma certa dignidade infinita: mais não se pode dizer de uma criatura, privilegiada, plena da graça divina, mas sempre criatura, sempre mulher de carne e sangue. A partir do Concílio de Éfeso, a maternidade divina de Maria é doutrina constante e unânime na Igreja. Repete-a o Concílio Vaticano II, na Constituição Lumen Gentium: "A Virgem Maria, que na Anunciação do anjo, recebeu o Verbo de Deus no coração e no corpo e trouxe ao mundo a Vida, é reconhecida e honrada como verdadeira Mãe de Deus e do Redentor" (n. 53). 

Acrescenta a Lumen Gentium: "Unida a Cristo por um vínculo estreito e indissolúvel, é dotada da missão sublime e da dignidade de ser Mãe do Filho de Deus, e, por isso, filha predileta do Pai e sacrário do Espírito Santo. Por este dom de graça exímia supera de muito todas as outras criaturas, celestes e terrestres" (n. 53). São Francisco, em sua singela e belíssima oração, intitulada "Saudação à Mãe de Deus", expressa a mesma verdade, com palavras embebidas de ternura: "Salve, ó Senhora santa, Rainha santíssima, Mãe de Deus, ó Maria, que sois virgem feita igreja, eleita pelo santíssimo Pai celestial, que vos consagrou por seu santíssimo e dileto filho e o Espírito Santo Paráclito! Em vós residiu e reside toda a plenitude da graça e todo o bem!". 

Lucas, o Evangelista mariano, procurou contar em palavras humanas o momento estupendo e inefável da Encarnação de Deus no seio de Maria. O dogma da maternidade divina de Maria está estreitamente ligado ao dogma da Encarnação do Filho de Deus. A partir daquele momento, o mistério e a missão de Cristo - Deus-homem e homem-Deus - une-se para sempre ao mistério e à missão de Maria de Nazaré. O mistério e a missão de Maria, porém, só têm sentido no mistério e na missão de seu Filho. Jesus, autor da Graça, toma carne daquela que ele plenificara de Graça já antes da Anunciação. Criaturas humanas e criaturas angelicais olham extasiadas o fato inimaginável: uma mulher ser genitora de seu genitor e a saúdam como filha de seu filho. 

Maria é chamada pelo anjo de "cheia de graça", porque "a Encarnação do Verbo, a união hispostática do Filho de Deus com a natureza humana se realiza e se consuma precisamente em Maria" (João Paulo II, encíclica Redemptoris Mater, n. 9). 

São Bernardo, num de seus sermões sobre a Anunciação, demora-se em observar Maria no exato momento de seu sim à maternidade divina, um sim que mudaria os rumos da história, que recriaria o mundo, que possibilitaria uma nova e eterna comunhão entre Deus e as criaturas. Transcrevo um trecho: "Ó Virgem piedosa, o pobre Adão, expulso do paraíso com sua mísera descendência, implora a tua resposta. Implora-a Abraão, implora-a Davi; e os outros patriarcas, teus antepassados... suplicam esta resposta. Toda a humanidade, prostrada a teus pés, a aguarda. E não é sem razão, pois do teu consentimento depende o alívio dos infelizes, a redenção dos cativos, a libertação dos condenados, a salvação de todos os filhos e filhas de Adão, de toda a tua raça. Responde depressa, ó Virgem! Pronuncia, ó Senhora, a palavra esperada pela terra, pelos infernos e pelos céus. O próprio Rei e Senhor de todos, tanto quanto cobiçou a tua beleza, deseja agora a tua resposta afirmativa, porque por ela decidiu salvar o mundo. Agradaste a ele pelo silêncio, muito mais lhe agradarás pela palavra ... Se tu lhe fizeres ouvir a tua voz, ele te fará ver a nossa salvação". 

Este trecho não só é retoricamente bonito, mas também nos ensina como Deus respeitou a liberdade de Maria. Não lhe impôs a maternidade divina. Predestinou-a, mas lhe pediu o consentimento. Elegeu-a desde antes da criação do mundo, ornou-a com todas as bênçãos e graças, mas aguardou seu sim, sua disponibilidade. 

O sim de Maria veio acompanhado de uma declaração de humildade: "Sou a serva do Senhor" (Lc 1,38). Volto a citar São Bernardo: "Que sublime humildade é esta que não soube ceder às honras e não sabe orgulhar-se na gloria! É escolhida para ser a Mãe de Deus e se proclama a serva. É certamente sinal de grande humildade não se esquecer de ser humilde quando é oferecida tamanha glória. Não é grande coisa mostrar-se humilde quando se é desprezado; ao contrário, é virtude insigne e rara ser humilde quando se é honrado". 

Com o sim de Maria, o Filho de Deus assumiu a carne humana; "subsistindo na condição de Deus, não se apegou à sua igualdade com Deus, ... tornou-se solidário com os seres humanos e apresentou-se como simples homem" (Fl 2,6-7). A paternidade de Deus une-se para sempre à maternidade da jovem Maria de Nazaré. O "faça-se" de Deus ao criar o universo soma-se ao "faça-se" de Maria para recriar, em seu Filho, todas as coisas na face da terra. Em Jesus Cristo, Messias e Salvador, não se separam mais a paternidade de Deus, que fecundou Maria mediante o Espírito Santo, e a maternidade de Maria, que acreditou no convite.

O "faça-se" de Maria encerra o tempo da espera; as criaturas, tendo à frente o Filho de Deus concebido no seio virginal de uma mulher, entram na "plenitude dos tempos" (Gl 4,4): "pelo ingresso do eterno no tempo, do divino no humano, o próprio tempo foi redimido e, tendo sido preenchido pelo mistério de Cristo, se torna definitivamente tempo de salvação" (Redemptoris Mater, 1). Maria tornou-se assim, como diz o Prefácio da festa da Imaculada, o início, as primícias da Igreja. 

Estamos diante de vários mistérios unidos, que perfazem o grande e inaudito mistério da salvação. É estupendo, mas verdadeiro. É inédito e acima de qualquer inteligência humana, mas é obra, graça e vontade de Deus e, como afirmou o anjo na hora da Anunciação, "para Deus, nada é impossível" (Lc 1,37). 

Embevecido diante do mistério da maternidade divina de Maria, São Boaventura (+1274), compôs um longo hino de louvor à maneira do Te Deum. Destaco alguns versos:

"Os coros dos anjos, com vozes incessantes, te proclamam: santa, santa, santa, ó Maria, Mãe de Deus, mãe e virgem ao mesmo tempo! Os céus e a terra estão cheios da majestade vitoriosa do Fruto do teu ventre! O glorioso coro dos apóstolos te aclama Mãe do Criador! Celebram-te todos os profetas, porque deste à luz o próprio Deus! A imensa assembléia dos santos mártires te glorifica como Mãe do Cristo. A multidão triunfante dos confessores prostra-se diante de ti, porque és o Templo da Trindade!".